Texto 2 – FREITAS,
Dirce. Nei. Teixeira de. Avaliação e
gestão democrática na regulação da educação básica brasileira: uma relação a
avaliar, Educ. Soc., Campinas, vol. 28, n. 99, p. 501-521, maio/ago.
2007 501
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O uso corriqueiro do termo gestão e da expressão gestão democrática está impregnado de imprecisões e obscuridade, a ponto de servirem para designar realidades diversas. Silva Júnior (2002) constatou que,
No
imaginário coletivo e em consideráveis segmentos do discurso educacional brasileiro,
gestão significa gestão empresarial, o que leva ao embotamento da produção do
significado de gestão educacional e à
mercadorização de seus critérios de ação.
O termo gestão sofreu um processo de adjetivação. De modo que hoje é
preciso um esforço teórico para que se possa apreender não só o emprego desse
termo, mas, principalmente, a lógica e os fundamentos de sua qualificação. Esse
esforço é indispensável para o correto discernimento dos qualificativos da
gestão educacional, encontrando-se, entre os mais usuais, estes: gestão democrática, gestão participativa, gestão
dialógica, gestão compartilhada, gestão gerencial, gestão estratégica, gestão
da qualidade total.
Para Silva Júnior (op. cit.), a qualificação da gestão como
“democrática” e “participativa” tem se revelado um jogo conceitual intencional,
cujo desdobramento sobrepõe esses adjetivos ao qualificativo “pública”. Isso
favorece a crescente prevalência da lógica do mercado educacional sobre a do direito
à educação. Não se trata, portanto, de uma questão de somenos importância. Para
o autor, a expressão “gestão pública” seria a mais apropriada para denominar o
sentido de uma gestão que rejeita a imposição de práticas de administração
privada na administração pública.
Regulação jurídico-legal: a gestão democrática e o lugar da avaliação
Importante como se deu a inscrição da expressão gestão democrática da
educação na regulação jurídico-legal vigente e, ao mesmo tempo, ressaltar o
lugar da avaliação nessa concepção de gestão, bem como a relação entre elas.
Para tanto, a análise parte de uma perspectiva histórica. Considera, de um
lado, as propostas formuladas nos anos de 1980-1990 por entidades da área
educacional nas Conferências Brasileiras de Educação (CBEs), no Fórum Nacional
em Defesa da Escola Pública (FNDEP)e em Congressos Nacionais de Educação
(CONEDs). De outro lado, foca projetos de leis de autoria e defendidos pelo
Ministério da Educação (MEC) e o ordenamento jurídico-legal construído no período
de 1988-2001.
Avaliação e gestão democrática: uma relação a ser avaliada
O que se viu foi o lugar que foi dado ou não à avaliação educacional na
construção da noção de gestão democrática na regulação jurídico-legal
brasileira vigente. Essa regulação propicia e instrumenta práticas de gestão comprometidas com relações mais
democráticas entre os envolvidos e, implicitamente, indica parâmetros de sua
avaliação. Esta passou a ser um dos meios para a participação na administração
pública pelos cidadãos, vistos como “usuários dos serviços públicos”.
Mesmo que o ordenamento constitucional não estabeleça explícita
associação da avaliação com o princípio de gestão democrática e nem determine
de forma direta a necessária inter-relação dessas práticas, nota-se que ele não
coloca entrave para os esforços de qualificação de ambas as práticas, ainda que
o financiamento educacional não a favoreça. Logo, a relação/inter-relação de
gestão e avaliação na educação emerge como objeto avaliativo.
Entende-se que tal inter-relação pode ser importante condição para a
difusão de valores democráticos e republicanos e, principalmente, do caráter
pedagógico e educativo de ambas as práticas.
A prática da avaliação concorre para a configuração de um padrão
de gestão mais ou menos próximo/distante do ideal democrático propugnado
por esferas públicas, pois a avaliação é um dos componentes constituintes da
gestão. Assim, tanto a forma como se dá a prática da avaliação como a
inexistência dela expressam os fundamentos, o caráter e o grau do compromisso de
democratização de determinada gestão. A forma como se avalia pode ser bem mais
reveladora da democratização ou não da gestão do que a existência de processos
e mecanismos de eleição, ação colegiada, ação coletiva e participativa.
O valor e a utilidade da avaliação para a gestão democrática precisam
ser considerados como critérios de aferição da pertinência da avaliação
efetuada. E, como manifestação da própria concepção de gestão democrática
prevalecente, pode essa prática, examinada em seu valor e utilidade, revelar e orientar escolhas relativas à vivência democrática
na educação.
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